Campo Belo/Vila Mariana

Vila Mariana conserva a primeira casa modernista do Brasil

A fachada branca da casa de linhas retas na rua Santa Cruz, na Vila Mariana, pode chamar a atenção, mas, hoje, dificilmente seria considerada chocante. É um padrão reconhecível em outras casas modernas espalhadas pela cidade e pelo mundo.

O choque foi na época em que a Casa Modernista do bairro da zona Sul de São Paulo foi construída. A residência do arquiteto Gregori Warchavchik (1896""1972), projetada por ele em 1927 e construída no ano seguinte, é considerada a primeira obra de arquitetura moderna feita no Brasil.

Bruno Santos/Folhapress
Casa Modernista, localizada no bairro da Vila Mariana, zona sul de São Paulo
Casa Modernista, localizada no bairro da Vila Mariana, zona sul de São Paulo

Suas características são a ausência de qualquer ornamento (elemento puramente decorativo), as formas geométricas bem definidas, a distribuição dos espaços segundo suas funções e valorização de materiais como vidro e ferro.

Causou polêmica até entre os seguidores do modernismo, movimento artístico que rompeu com a estética tradicional, marcado no Brasil pela realização da Semana de Arte Moderna, em 1922.

"Por muito tempo se debateu sobre o 'real' modernismo da casa, porque Warchavchik usou técnicas e materiais convencionais na construção", diz a arquiteta Karina Yuri Irino, autora de pesquisa sobre a residência, tombada pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo)em 1984.

O arquiteto nascido na Ucrânia e naturalizado brasileiro é o autor do primeiro manifesto da arquitetura modernista no país, "Acerca da Arquitetura Moderna", de 1925.

A casa que construiu após se casar com a paisagista brasileira Mina Klabin seria a concretização desses ideais. Faltou concreto –o uso desse material também é uma das características da arquitetura modernista.

A construção de tijolos foi revestida para simular concreto armado e coberta com um telhado convencional, de telhas de barro, escondido por uma moldura branca.

"Ele usou esses artifícios porque, na época, não havia tecnologia para seguir os princípios modernistas ao pé da letra e os materiais eram muito caros", diz Irino.

Mesmo sem ser 100% moderna, a casa é emblemática. A partir da década de 1980, os estudiosos começaram a interpretar essas concessões à construção convencional como símbolo da transição promovida pelo movimento modernista no Brasil.

"As características importantes estavam lá, desde a lógica do percurso nos ambientes da casa, que ficou menos labiríntico, até a limpeza das linhas", afirma Irino.

Quando estava fazendo sua pesquisa, entre 2003 e 2005, Irino teve dificuldade para testemunhar essas formas limpas. "Na época, o local estava lacrado. Para visitar a casa eu tinha que assinar um termo de responsabilidade", conta.

Após a ordem de tombamento, os herdeiros de Warchavchik, que em 1983 tinham tentado vender a casa, abandonaram o imóvel.

Após dez anos de disputa na Justiça, saiu a sentença obrigando o Estado a indenizar o proprietário e a comprar o imóvel. Os projetos para recuperação começam em 2000.

No final de 2008, a casa foi aberta ao público. Atualmente, a visitação pode ser feita de terça a domingo, das 9h às 17h, gratuitamente.

PARQUE MODERNISTA

A visita compreende a casa e o parque que a circunda: uma área de 13.000 metros quadrados com paisagismo da mulher do arquiteto, Mina. No projeto inovador, ela utilizou várias espécies tropicais, como o mandacaru, algo inusitado à época.

A casa e o parque também abrigam eventos culturais, como shows de música ou dança –a programação é divulgada no site do Museu da Cidade (museudacidade.sp.gov.br), rede de construções históricas administradas pelo DPH (Departamento do Patrimônio Histórico).

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